O Deserto dos Tártaros
O Deserto dos Tártaros

O Deserto dos Tártaros

Título: O Deserto dos Tártaros

Autor: Dino Buzzati

Editora: Nova Fronteira

Páginas: 206

Resumo do livro O Deserto dos Tártaros

Dino Buzzati foi um escritor e jornalista italiano. Em 1940, publicou O Deserto dos Tártaros, considerado sua obra-prima e um marco da literatura italiana do século XX. O romance inspirou uma adaptação cinematográfica em 1976 e recebeu dos contemporâneos aclamação que o colocou ao lado de obras existenciais, às vezes comparado ao universo kafkiano, ainda que permeado por uma prosa simbólica.

O Deserto dos Tártaros – História

Giovanni Drogo chega ao Forte Bastiani como um jovem oficial recém-formado, cheio de expectativas e com uma lealdade intacta à carreira militar. O forte ergue-se isolado entre rochedos e montanhas, olhando para uma planície interminável — o lendário deserto dos tártaros — cujo vazio parece uma promessa e uma sentença ao mesmo tempo. Bastiani é, ao mesmo tempo, vigilância e prisão: uma fortaleza antiga, mal mantida, cuja função real se dissolve na própria espera.

Logo nos primeiros dias, Drogo resiste à ideia de enterrar sua juventude naquele posto remoto. Ele procura transferências, imagina destinos mais ativos, tenta escapar da sensação de inutilidade que o lugar inspira. É então que, gradualmente, um poder mais sutil e mais eficaz o captura: a dinâmica coletiva do Forte, a disciplina, a reverência quase mítica por um destino militar que se prenuncia no horizonte, e a ideia de que a verdadeira honra pode sempre chegar amanhã. Essa sedução da espera — que transforma frustração em virtude — acaba por ancorá-lo em Bastiani.

“Agora, sim, conhecia a sério o que era a solidão. Cada um tem suas próprias ocupações, cada um mal basta a si mesmo.”

Em determinado momento Drogo recebe uma licença e volta ao que restou de sua vida civil: a casa da mãe, as ruas de sua cidade natal, a familiaridade de quem era antes. O reencontro é um choque: a cidade parece pequena, estranha; a vida que ele deixou para trás foi, em larga medida, assumida por outros e dissolvida pelo tempo. Mais do que voltar para casa, esse episódio faz com que Drogo perceba que já não pertence inteiramente àquele mundo. O Forte, com sua rotina e seu mito, já o reivindicou. 

Os anos passam com uma lentidão que é ao mesmo tempo real e metafísica. A rotina militar transforma-se em liturgia: trocas de guarda, senhas, patrulhas, inspeções — atos que lembram serviço mas cujo sentido prático é cada vez mais duvidoso. A guarnição inteira vive sob a expectativa contínua de um ataque que sempre parece possível e nunca acontece. Essa esperança permanente organiza a vida do forte: a espera dá sentido ao tempo, e o sentido dá justificativa às renúncias.

“Tudo se esvai, os homens, as estações, as nuvens; e não adianta agarrar-se às pedras, resistir no topo de algum escolho, os dedos cansados se abrem, os braços se afrouxam, inertes, acaba-se arrastado pelo rio, que parece lento, mas não para nunca.”

Quando, décadas depois, surgem no horizonte sinais de que as coisas podem finalmente mudar: a visão distante de tropas, movimentos que prenunciam ação, Drogo, já corroído pelo tempo, enfermo, é dispensado do posto por motivos de saúde; a batalha que poderia dar sentido à sua espera se dá quando seu corpo não o permite mais participar. No retorno à vida normal, enquanto é conduzido para a cidade e para uma existência que já não é sua, ele revê, em flashes, o jovem que subira a montanha à procura de glória. Com essa memória, compreende a dura ironia que marcou sua existência: vivera inteiro à espera de um acontecimento que justificasse tudo, e esse acontecimento, quando afinal pareceu existir, chegou apenas para confirmar que a espera o havia consumido. Resta a Drogo, agora, apenas esperar pela morte.

“Quanto tempo à frente, pensava. Entretanto existiam homens – ouvira falar – que a uma certa altura se punham a esperar a morte, essa coisa conhecida e absurda que não podia ter nada a ver com ele.”

O deserto que se estende diante do Forte Bastiani funciona como um espelho da condição humana: vasto, silencioso e inóspito, representa a incerteza de um futuro sempre adiável. Cada grão de areia evoca os segundos que se acumulam sem que percebamos, e a monotonia das planícies reflete o ritmo cadenciado de dias que se sucedem sem grandes transformações. Ao mesmo tempo, a imensidão desértica guarda uma tensão latente, pois é no vazio aparente que pulsa a possibilidade de um evento capaz de romper o silêncio — tal como Drogo aguardava uma invasão que nunca chegava.

Com o envelhecimento de Drogo, o deserto deixa de brilhar em cores vivas para adquirir tons pastéis, quase desbotados pelo tempo. Essa transição cromática simboliza a erosão de sonhos e a desaceleração da percepção, tornando-se metáfora da passagem irrevogável dos anos. A cada pôr do sol sobre as dunas, somos lembrados de que o tempo consome nossa vitalidade, mas também lapida nossa compreensão da existência: no deserto, somos ao mesmo tempo expectadores e prisioneiros de uma paisagem que nos pertence apenas enquanto esperamos.

“No íntimo, existe até a tímida satisfação de ter evitado bruscas mudanças na vida, de poder entrar de novo tal e qual na velha rotina. Ilude-se com uma desforra a longo prazo, acredita possuir ainda uma imensidão de tempo disponível, renuncia desse modo à mesquinha luta pela vida cotidiana.”

O Deserto dos Tártaros – Conclusão

Um dos aspectos mais notáveis do romance está no modo como Buzzati descreve as paisagens: ricas em cores, sons e detalhes, elas funcionam como espelho da interioridade de Drogo. No início, quando a juventude ainda lhe dá vigor e esperança, o horizonte do Forte Bastiani surge como algo vibrante, carregado de possibilidades; cada nuance da luz, cada sombra no deserto parece prenunciar aventuras e glória. À medida que o tempo avança e Drogo envelhece, porém, sua percepção se transforma: o que antes era promessa passa a ser monotonia, e as cores vivas do cenário tornam-se apagadas, diluídas, como se a própria natureza fosse tomada por um tom pastel. Assim, a paisagem, antes plena de significados, se torna uniforme e indiferente, refletindo o olhar pasteurizado de um homem que vê a vida perder gradualmente o frescor da novidade.

O Deserto dos Tártaros fala dos momentos em que aguardamos as condições ideais para agir, só para descobrir que a vida transcorre enquanto permanecemos à espreita. Somos coelhos correndo atrás de uma cenoura fixada por um galho às nossas costas, sempre imaginando estar perto dela, mas eternamente à mesma distância. O tempo é, simultaneamente, nosso aliado, pois amadurece escolhas e nos ensina a desacelerar, e nosso vilão, pois encurta o número de nossos dias. Não há garantias de um começo perfeito: podemos perder a largada, atrasar-nos ou temer o desencontro de circunstâncias. Ainda assim, sempre há um ponto de partida. Comece hoje, agora: seja senhor do seu tempo e, assim, senhor do seu mundo.

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